Estrela no Vazio Entupido

Processos


Vim do meio, do centro, onde tudo cabe. Força que vibra, envolve, abraça. É preciso união. Mãos dadas, irmãos.  Coluna, raiz e força do que está atrás.  A energia que vem do chão em espiral.
Conforta, gruda, amassa e junta. Devolve pro centro, pro todo, onde tudo cabe. Vibra, resiste. Acalma, emana nos poros a força do centro e acalma. Pousa, repousa e devolve. A cabeça um pouco procura, outro pouco aceita, assenta. Pouco vê mas tudo sabe. Como se falassem com a terra, ou através dela. Focado  num passado que era ali mesmo.
“eu vou chegar lá” – no fim da história. História que não tem fim, porque eles ainda estão ali. Não sei se estou sentindo ou imaginando.
Exploração da terra, trabalho escravo de índios e paraguaios, mulheres estupradas, alimento, conversa das rodas de tereré.
Me amolece o corpo, uma lágrima é trabalhada cá dentro, mas ela não quer cair.
Quem não tem nada precisa se mover. E se mexem, rebolam, gritam e acontecem. Aqueles que estiveram cá dentro.  E os que estão ainda, trabalho semi-escravo. Se submetendo ao domínio de um outro, ou pior, ao domínio do estomago. “tudo que existe é a fome” e “a coragem vem do estomago”.
Um cheiro de fogo, o calor e o suor, o cheiro do mate apressado no fogo, abatido, remexido. E muito peso nas costas. Carregando na coluna,nos joelhos, na testa, sem olhos, sem palavra, carregando a erva, folha, o mundo, a esperança. O verde pesado que vira pão e humilhação. Uma luz no clarão do mato e o homem Uru. O pássaro da noite e o homem que controla o fogo e a força do chão. Canta, grita, imagina até sem dormir.
Tá lá e vive, e não se arrepende, e sofre e não reclama, compete, quem não tem nada tem vaidade. Quer ser admirado, quer vencer,ainda que seja  não mudar.
Depois reconheci o chão, fluído. O equilíbrio com os braços e o quadril bem fincado nas pernas, pesando pro chão que se abria mais e mais como se quisesse revelar alguma alegria.
E a lama ganhou ares de festa. De amor, suave e refrescante, calmante.
Saber comparar a própria cultura, pra se encontrar, é presente, não é passado, se faz em cada respirar.
Ela que aprendia tudo com a avó, que andava pelo mato e conhecia os nomes das plantas em guarani, ela foi pra aula com professoras que falavam português, que ensinavam o que? Bons modos a mesa? Não sei.
Tudo que se precisa aprender no mundo indígena está guardado com a terra, árvore, sol, água? Será? Existe uma tal civilização e uma tal sociedade e mais um tal contato! Era preciso desenhar no chão para entender as palavras, então, foi aprendendo com a avó a desenhar o mundo, a inventar as formas e a arte foi surgindo em suas vistas. Foi preciso reinventar, pois o encontro trouxe magoa, sangue e morte.
Fez o índio se travestir e querer mandar no próprio índio. Desautorizou os caciques em nome de um  canhão e bala de um capitão. Mas essa é uma outra história. Aqui se  sabe mesmo é da história dos gemes Sol e Lua. A Lua é vaidosa! O Sol bondoso, ilumina e aquece, faz o verde mais verde e  florescer. A Lua guarda segredos, é guardiã dos que já morreram, ilumina o caminho dos sem vida, vem pra descansar e pra iluminar o caminho de volta pra casa.
Lua e Sol, morte e vida, do escuro e claro...tantas histórias! O mundo é deles e nesse mundo cabe outros mundos... é tolerável o encontro.
A dança e o encontro é tão ancestral quanto a luz do sol. Antes de tudo havia dança, o guachiré com alegria, na matéria disforme, sem luz que se sabia água. Então ouviu-se uma voz e assim se fez, o bebe engatinhando por sobre a substância que se sabia água, fez o chão se firmar e criou os quatro cantos do mundo.
Um lugar para ser feliz, amigos e o mistério. O perigo sempre a espreita.Brinquedo curioso, terra e liberdade.
Ainda não está pronto, talvez não esteja nunca, porque essa descoberta não tem fim.
É uma viajem, porque quem não tem nada tem que se mover.  A gente se joga no escuro da noite, sente a terra nos abraçando, sente os segredos guardados pela Lua.
Ninguém sabe onde esse caminho vai dar. Estrangeira na fronteira, entre ciência e a arte, entre doação e compreensão.
Há ainda o desconhecido que se obstina a questionar o que se presencia
E eu sinto que alguma coisa falta, sempre falta. Talvez a falta que ascende o movimento, pra preencher o que está vazio, mesmo sendo o vazio presente. Eu sinto coisas como “vai” e essa vontade de me perder.
Então hoje eu viajei  no vento, na cor, na dor, no cansaço, na persistência, no medo, na magoa, na marra, na liberdade.  Tem algumas mil lembranças e tem aqueles abraços generosos.
Fazendo som de amor. É descoberta e é fita que amarra corações alados para carregar outros de pedra. Não, é uma palavra que inexiste.
Deixa o corpo levar, sair do lugar pra transformar, transtornar. Sem os braços e abraços eu não estaria de pé. Aprendo Aprender a confiar no acaso. Na desestrutura. No caos. No que vem. No encontro. Na dança. No movimento. No arquétipo. Na intuição. No laço. 
Palavras Inúteis
Policia Politica Poder
conhecimento e ilusão
o meu jeito de sentir 
é pra ficar puta
botinas na cultura
lábio apertado 
voz que fala como bois
as vacas estão velhas e caminham devagar
palavras inúteis
o cancro incrustado no estomago
o vomito azedo na agonia
é pra criar fantasias
racionalizar o que se sente 
sentir o que é racional e burocrático
sonhos
sabotagem
é pra ficar calmo no vento forte de agosto